terça-feira, 2 de setembro de 2008

QUAL A TÉCNICA CORRETA? QUAL O ESTILO CORRETO?




Alex Pussieldi
Publicado em 01/07/2003


QUAL A TÉCNICA CORRETA? QUAL O ESTILO CORRETO?
Artigo técnico do Coach Alex Pussieldi a respeito das variações de nado por diferentes nadadores com sucesso em performance.

Sempre que começo uma clínica eu gosto de fazer uma brincadeira com os participantes da mesma. Convido três pessoas do auditório para virem a frente e seleciono-as pegando um mais gordinho e grande, um de porte médio, e um baixo e magro. Na frente ofereço aos três um presente, normalmente uma camisa do Fort Lauderdale Swim Team como brinde mas eles precisam vesti-las ali mesmo sobre as próprias camisas.

Intencionalmente entrego a camisa tamanho "P" ao mais gordinho, a média ao de porte médio e a "GG" ao mais baixinho. Insisto para que vistam a camisa e digo que só vão levar a camisa se realmente vestirem ela lá na frente da platéia. Apenas o de tamanho médio está livre das dificuldades no vestimento da camisa. A situação é divertida e até embaraçadora. Ao final das inúmeras risadas e tentativas, finalmente eu entrego as camisas dos tamanhos "exatos" aos participantes que voltam aos seus lugares comemorando os prêmios recebidos.

A brincadeira serve para quebrar o gelo e inciar a palestra trazendo um tema importantíssimo: "NEM TODA CAMISA SERVE EM QUALQUER CORPO". Todas as camisas são tecnicamente iguais, fabricadas com a mesma tecnologia, mesma cor, mesma textura, mas elas não se adaptam a qualquer corpo por uma simples (ou complexa) razão: nem todos tem a mesma estrutura física.

Tal tipo de brincadeira e conclusão abre uma discussão que faz parte de uma tese que defendo em minhas palestras: "Nem toda técnica pode ser absorvida por diferentes nadadores". Ou seja, determinados padrões podem servir para determinado nadador mas jamais servirão para todos os nadadores.

É muito importante que você entenda este processo até para que você possa ter mais sensibilidade e até habilidade em conseguir observar que determinados tipos de técnicas podem ser adicionados em determinados nadadores mas não em todos.

Essa é a razão porque determinados nadadores conseguem nadar crawl com o braço extirado na recuperação aérea (Michael Klim, Austrália), e outros com o cotovelo alto (Ian Thorpe, Austrália), e ambos tem sucesso. Da mesma forma, alguns nadam o peito moderno ondulado (Ed Moses, USA) e outros conseguem seus melhores resultados com o peito mais tradicional antigo (Domenico Fioravanti, Itália) e também com performance para ambos.

Os exemplos poderão ser centenas e sempre encontraremos variantes para resultados de expressão em diferentes técnicas, características e posturas não só no nado propriamente dito, mas na posição do corpo na água, na saída, entrada e execução de virada e chegadas.

Lembro do falecido Rômulo Arantes, uma das maiores glórias da natação brasileira, que numa viagem juntos a Colômbia como treinadores da Seleção Brasileira Juvenil me revelou que gostaria de escrever um livro revelando as inúmeras variações de trabalhos de treinadores e mesmo que trabalhando de forma diferente todos conseguiam resultados positivos.

Essa discussão só serve para você treinador pensar e ver que não faz sentido simplesmente assistir um nadador de expressão fazer algo diferente para que você passe a repetir amanhã com seu jovem campeão em formação. Você precisa estar ciente que isso pode ou não dar resultado e essa adaptação dependerá da prática, da assimilação mas acima de tudo das características do nado de cada um.

Lembro de Gennadi Touretski, treinador russo, que estava anos radicado na Austrália. Ele conseguiu ter em determinada época o recordista mundial dos 50 livre, o russo Alexander Popov nadando em um crawl com o cotovelo alto na recuperação mas uma finalização curta, o chamado "crawl kayak", e também o recordista mundial dos 100 livre, o australiano Michael Klim, nadando em um crawl com a recuperação aérea do braço completamente extendido.

Como pode isso? Dois estilos totalmente diferentes de características diferentes e pelo mesmo treinador diariamente? Sim, e o melhor de tudo: com grandes resultados, ou você conhece algo melhor do que recorde mundial?!?

Habilidade e conhecimento do treinador Touretski e principalmente sensibilidade em reconhecer que as técnicas diversas se adaptaram melhor nos diferentes corpos. Já pensou que tipo de orientação Touretski diria no treino: "Levante o cotovelo Alex, extenda a mão alta Michael, finalize até o final Mike, ei Alex faça a sua remada de kayak mais curta...".

Entre inúmeras variações de técnica, algumas características de nado são indiscutíveis, ou melhor, de valores técnicos e propulsão mais efetiva e que devem ser utilizados por todos. Exemplo: a posição do cotovelo mais alta na puxada do crawl. Você tem nadadores que nadam puxando a braçada em "S" (Anthony Ervin, USA medalha de ouro nos 50 livre em Sidney), ou puxando ela reta (Grant Hackett, Austrália medalha de ouro nos 1500 livre também em Sidney). Porém, ambos têm a posição do cotovelo alta durante toda a ação da puxada.

Podemos citar algumas outras variações de opção técnica e todas com sucesso, algumas delas colocaremos exemplos para comprovar o resultado de alto nível pelos atletas:

· Uso do giro do quadril no nado crawl (Fernando Scherer, Brasil), rolamento do ombro sem muito uso do quadril (Gustavo Borges,Brasil).
· Saídas de atletismo nas provas de velocidade, saídas convencionais nas provas mais longas.
· Finalização da braçada de costas junto ao quadril (Aaron Peirsol, USA), finalização da braçada um pouco mais afastada (Lenny Krayzelburg, USA).
· Pernada de 6 tempos para fundista (Ian Thorpe, Austrália) ou pernada de 2 tempos para fundista (Brooke Bennett, USA).
· Borboleta com uma respiração a cada ciclo de braçada (Michael Phelps, USA) ou a cada 2 ciclos (Tom Malchow, USA).

Tais variações não param de vir a nossa mente se começarmos a pensar e relacionar como a virada de costas para o peito no medley (normal ou com cambalhota), respiração unilateral, bilateral ou até como o húngaro campeão mundial dos 400 medley Tamas Darnyi fazia respirando para os dois lados no mesmo ciclo de braçada, você lembra? E o nado borboleta que com o ex-recordista Michael Gross na década de 80 era longo e finalizava lá trás e com muitos hoje em dia é curto e finaliza na altura do calção!

Esta lista não terminaria nunca, e também não é o tema principal de nossa discussão aqui apresentar as diferentes técnicas que dão resultados. Nosso objetivo é mostrar que não adianta você pegar diferentes técnicas colocar dentro de seu nadador com a certeza de que irá dar certo. Não é uma vitamina aonde colocamos diferentes ingredientes dentro de um liquidificador batemos e é só tomar. Muito longe disso.

O treinador que se preze terá de pesquisar, estudar e acima de tudo experimentar. Ter coragem para isso é muito importante. Talvez por isso em nossa profissão nunca jamais poderemos parar de estudar e pesquisar, isso deve fazer parte de nossa rotina diária de atualização. Ignorante (aquele que ignora o conhecimento segundo o próprio Aurélio) será aquele que desconhecer a constante atualização, pesquisa e estudo como forma de melhorar o seu trabalho.

Me lembro muito bem que em 2000 eu estava a escrever um de meus primeiros artigos ("O Novo Crawl") e tive do treinador americano Jack Nelson a melhor definição para esta discussão. Eu lhe perguntava sobre qual seria a melhor técnica de crawl, já que discutíamos a nova posição do nado, a puxada reta, recuperação aérea, posição da cabeça mais baixa, enfim tudo que está descrito no artigo e que me fazia questioná-lo: "Qual a melhor técnica?". A resposta do experiente Jack Nelson (então com 69 anos, dos quais 49 de natação) foi a mais esclarecedora possível: "Me dê o atleta que eu lhe dou a técnica".

O raciocínio de Jack Nelson é o mais perfeito possível. Ver as características físicas de seu atleta, tempo de treinamento, história em treinamento, possibilidades de desenvolvimento, enfim tudo o que se relacionar ao mesmo é que irá lhe dar a oportunidade de utilizar determinada técnica ou não. Bom treinador será aquele que for capaz de identificar que técnica específica servirá e se adaptará ao mesmo.

Este artigo vai servir para duas coisas, uma que a partir de hoje você treinador irá pensar e pesquisar melhor cada técnica e observação que fizer (por isso é tão importante estar em grandes competições e clínicas). Tal tipo de observação combinada com o conhecimento seu sobre o seu atleta irá lhe dar a conclusão de qual técnica será melhor assimilada por ele.

A segunda é que a partir de hoje vou ter de pensar em uma nova brincadeira para as minhas clínicas, pois essa das camisas trocadas já não vai ter mais graça pois todo mundo já vai ler aqui neste artigo.

Sucesso a todos!!!!


COACH ALEX PUSSIELDI
Head Age Group Coach Fort Lauderdale Swim Team

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